quinta-feira, 29 de abril de 2010

Um apelo á cidadania, ontem, 28 de Abril, na Alameda do Marco




Ontem, na Alameda Miranda Rocha, no Marco de Canavezes, durante a iniciativa "Marco de Letras", ouvi (e vivi) o concerto dos "Rising Sun".

Esse duo (dois sublimes jovens, na presença, voz e nos instrumentos musicais manuseados), do Marco, fruto de uma instituição privada pioneira na ocupação de tempos livres (a "Preceptor"), proporcionou-me uma "lavagem de alma".

Como dizem num brilhante panfleto de apresentação, são um "projecto ovo" (não é erro ortográfico em relação a "novo") de um projecto maior, visando a iniciação de jovens no mundo da música. Dizem, com clareza, que não visam a "anarquia do estudo", mas "um entretém paralelo que, quando bem canalizado, se revela proveitoso para o ofício escolar".

Mas detenho-me no Concerto (foi isso que aconteceu) do Edu e da Marta.

Já vi e ouvi muitos "covers" de clássicos dos anos 60 e 70, que, até, são do meu tempo de juventude.

O que vi e ouvi, ontem, foi uma apresentação e interpretação sóbria e profunda (aliás, com uma excelente componente visual produzida para o efeito), feita por dois jovens que, demonstraram, sabiam o significado e o conteúdo daquilo que cantavam e tocavam, não na perspectiva "saudosista" , mas indiciando que percebiam a actualidade da mensagem associada.

Temas difíceis de interpretar, como "Let it be", foram recriados sem que houve uma falha de timbre de voz ou nota musical.

Falei de uma "lavagem de alma", que tenho de agradecer ao Edu e à Marta.

A "lavagem" foi, no fundo, sentir que os temas da Liberdade, da "revolta contra o estabelecido", da "harmonia universal", embora de outras formas, continuam vivos e conseguem sensibilizar. E que a educação cívica é isso mesmo.

E, afinal, os "Rising Sun" fizeram, ontem, um acto de educação cívica. Que tanta falta nos faz, a nós e, sobretudo, àqueles que, todos os dias, se confrontam com "arrivistas políticos" que disso pouco percebem (até o abominam), e que, para cúmulo, nem frequentam estas actividades no Marco (e, talvez, em lado algum, pois vivem cheios de si mesmos...).

Como disse a representante da Câmara, na conclusão do Concerto, foi um momento de qualidade, que tem um rosto.

O resto é a "Preceptor", que há anos apostou neste modelo de extensão educativa. Mas, é verdade, as empresas são feitas por pessoas. Neste caso, por pessoas que, há muito, acreditaram que valia a pena investir toda a sua vida na Região, todos os dias e não só ao fim de semana ou em períodos eleitorais.

Pelo momento de regeneração espiritual e cívica que me proporcionaram, o meu OBRIGADO ao Edu e à Marta.

Façam um bom marketing e, em locais apropriados, continuem a semear a esperança nos valores que essas canções transmitem (mesmo nos vossos temas originais!).

terça-feira, 6 de abril de 2010

Leram-me histórias para adormecer....




Não, o título não é uma ironia, nem remete para nenhum dos muitos textos, de algum dos "serviçais" do "sindicato de voto" que, em nome de um certo PS e de Artur Melo, Jaime Teixeira e uma das tais famílias que um xenófobo denominava como tendo 4 gerações (nascidos? residentes? activos?de "esquerda"?) no Marco e outros criaram, onde o dito Jaime, como "amanuense" de serviço, no seu decrépito (quem o viu e quem o vê...) blog Marco Hoje , se dedica a escrever, sobre mim, quase sempre sem me nomear, criticas e juízos, como quem se vê ao espelho e reporta uma triste vida, (essa sim), só "redimida" numa colagem a Artur Melo, que tão mal servem. Enfim, estas sim, a de Jaime Teixeira, tristes vidas, que só nesta sua tardia idade reconhecem convicções de socialista do PS. De facto, tristes vidas, daqueles que não podem mudar, porque nunca estiveram em lado nenhum, nem matriz de vida parecem ter (aliás, o dito Jaime odeia o termo "matriz", como disse e escreveu, mormente quando se chama "ideológica", porque só vê interesses e segundas intenções em tudo; enfim, o seu espelho).

Mas deixemos estes resquícios de Estado Novo a quem os alimenta, pois a clarificação está por dias. Vamos a coisas mais profundas, que essas "tristes vidas" não abarcam. A não ser quando lhes servem os interesse operacionais.

Vou ao que interessa, ao que, de facto, marca a vida e significa afectos duradouros, partilhas de vida, cumplicidades, educação para a Vida, que, essas sim, mudam a "vida" de cada um e, logo, o Mundo.

Tenho uma sobrinha, com 8 anos, chamada Sara, que, desde que nasceu, passa o Natal, a Páscoa, algum tempo de férias, na minha Casa. Que, é verdade, já foi em Beja, em Estremoz e agora é (e para desgosto de alguns, será) no Marco . Fico feliz por lhe proporcionar essa riqueza de vivenciais territorializadas, que ela aprecia, sempre, com intensidade.

Ontem, a Sara resolveu que tinha de me ler histórias para eu adormecer.

Leu-me 3 histórias ("O Coelho Branco", "Os 3 porquinhos", "Harry e o balde dos dinossauros").

E eu adormeci.

Confesso que há 45 anos que ninguém me fazia tal.
Significa que o afecto se manifesta, na forma em que mais gostámos dele. Há 45 anos, quando a TV não existia para todos (como os meus Pais), a minha Mãe lia-me histórias. Há uns 23 anos, já havia TV, a minha filha pedia-me para eu lhe ler histórias e as "explicar", ou seja, dizer o que é que aquilo tinha a ver com o nosso comportamento.

Ontem, a Sara, minha sobrinha, leu-me histórias "à antiga" : com o simples intuito de me tranquilizar, porque , do "alto" da sabedoria dos seus 8 anos, julga que é disso que eu preciso, talvez por causa da vida "rica" (ou será "triste", como diz o tal Jaime ?) que tenho de viver.


Por isso devia haver uma "Sara" na vida de cada um.

Para, pelo menos, nos repor no essencial das relações entre os seres humanos: o afecto que reconforta e alimenta e não é estéril, porque leva uma mensagem de vida.


Mas esse é um privilégio que eu tenho.

sábado, 3 de abril de 2010

Sobre o sentido social da morte de Jesus Cristo


Estes texto foi publicado, por mim, no Jornal "Açoriano Oriental", de Ponta Delgada, na longínqua Páscoa de de 1992; foi republicado no Jornal "Clarim", de Arruda dos Vinhos, na Páscoa de 2004.
Hoje, recupero-o, 18 anos depois.
Porque hoje voltaria a escrever o mesmo.

" Não é novidade, para ninguém, a importância que o calendário judaico-cristão atribuiu á Páscoa. Embora por razões e factos diversos, essas duas grandes famílias religiosas fazem,desse tempo, ponto alto do seu ano.
Gostaria de me reter sobre o facto que, para todos os cristãos, marca a Páscoa : a morte/ressurreição de Jesus.
Quero fazê-lo como simples "leigo", ou seja, enquanto pessoa que acredita que, para além das leituras mais ou menos "místicas" e "sagradas", há um significado social, uma interpretação "civil" desse acontecimento, que é património de toda a Humanidade, do qual nenhuma Igreja institucionalizada é proprietária exclusiva.

Há dias, ouvia num templo católico, um sacerdote afirmar que Jesus havia morrido por nós, para nos "resgatar". Tudo bem. Mas, para nos resgatar de quê ? Da morte, dirão alguns, pois deu-nos a vida eterna; do pecado, dirão outros, pois assumiu, sobre si, as culpas de todos nós. Perfeito ! Na catequese dominical aprende-se muito....
Mas, para alguém que não tenha fé, que não acredite na vida eterna, que ache o pecado uma figura de retórica, que ensinamentos pode tira da morte de Jesus ? É aí que me quero deter, dando despretensioso contributo para uma interpretação "civil", social, da morte de Cristo.

A morte de Jesus é a aniquilação do Eu.
Explico-me :
Jesus disse um dia "Eu sou a Vida"; quem tal afirma, não pode ter personalidade frágil, nem desejar a morte, nem escolhê-la, como um vulgar suicida. Nada nos Evangelhos permite pensar tal.
Jesus apresenta-se como um homem determinado, que afronta o "establishment" da época. Por exemplo, uma vez a multidão pretendia precipitá-lo de um monte, , mas, segundo os Evangelhos, Jesus, muito naturalmente, "passou por entre eles e seguiu, sem ser molestado". Isto só pode ser feito por alguém de forte carácter.
Assim, como primeira conclusão, resulta que Jesus era um Homem de forte personalidade.

Passemos a um segundo aspecto. Um dia, Jesus afirmou: "Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me".
"Negue-se a si mesmo". Que pode significar tal expressão ? O mesmo que muitos outros convites que fez : para "deixar tudo" e segui-lo, para "não olhar para trás, após ter deitado as mãos ao arado".
Mas avancemos mais.
S. Paulo fala, anos depois, do "Homem Novo", fruto da "morte" do Homem sem fé. O próprio Jesus já havia falado de "nascer de novo".
Fica claro que, nesta acepção, a mudança, para a nova vida que Jesus trazia, se fazia pela negação da anterior, por um corte com a vida que, até aí, se fazia; ou seja, é condição, para a nova vida, que se deixe a antiga.
Eis a segunda conclusão : teríamos de nos esvaziar de nós mesmos, para que, dentro de nós, algo nascesse de novo, diferente.

Juntemos, agora, essas duas conclusões. Um homem, de forte personalidade, ensina os outros a esvaziarem-se de si mesmos. Paradoxalmente, parece que quer ser seguido por gente despersonalizada, que, voluntariamente, perdeu o carácter, para serem do seu "rebanho".
Nada mais errado. A chave da interpretação do paradoxo é a morte de Jesus.

Expliquemos: Jesus morre porque quer.

No seu processo jurídico, teve várias "deixas" para evitar a condenação. Não o fez. Para cúmulo, já crucificado, acusa Deus Pai de o ter abandonado ("Meu Deus, porque me abandonastes ?").

Eis a chave : Jesus, o tal homem de forte personalidade, considerando-se o Filho de Deus, experimenta a suprema negação de si mesmo, de todas as suas certezas, deixa "cair" todos os seus atributos por terra : já não é o líder de massas, o suposto "rei" dos Judeus, sequer o Messias, muito menos o filho querido de Deus. Experimenta a suprema aniquilação do seu "eu", deixa por terra aquilo que ele mesmo sabia ser.

Que podemos concluir : o Cristianismo é o elogio da desporsanilação ? Não, não nos precipitemos.

Jesus aniquilou o seu "eu", experimenta a "morte"; de tudo, mesmo das suas certezas. Mas, atenção, ressuscita, depois. Ou seja, reassume todo o seu ser, todo o seu "Eu", mas, digamos, já fortalecido, robustecido, consolidado, transformado pela experiência que foi perdê-lo.

Então, que conclusão tirar ?

Como religião de preceitos sociais, o Cristianismo é de vivência colectiva. O próprio Jesus havia dito "Onde dois ou mais estiverem juntos em meu nome, eu estarei no meio deles" (Mat.18:20). Ou seja, a morte, a aniquilação do nosso "Eu", só tem sentido se acontecer para que algo nasça de novo. mais robustecido. Jesus não diz "Onde um estiver em meu nome", mas, sim, têm de ser dois ou mais...; assim, só faz sentido que eu deixe "cair" a minha concepção de vida, a minha ideologia, a minha personalidade, se, daí resultar o surgimento de uma nova ideia de vida, uma nova forma de ver o mundo, uma personalidade nova.

É este o sentido social da morte de Cristo : Não há personalidades, certezas, ideias, filosofias, que se possam considerar fortes se, continuamente, não estiverem dispostas a deixar-se "cair" a "negar-se", para que depois nasçam de novo, mais robustas e transformadas.

Esta "negação" tem um profundo sentido social. Se eu, perante o outro com que me relaciono (em casa, no trabalho, na vida social e política, etc), me dispuser a perder a minha ideia (mesmo que a julgue a mais adequada), a minha concepção, a minha imagem, concerteza estou mais aberto a ouvir o outro, a considerar a sua opinião, a ver o positivo das suas propostas. E o outro, se estiver na mesma disposição de "negar-se a si mesmo", sem dúvida que, entre nós, no meio de nós, nascerá uma ideia mais perfeita, uma concepção mais aperfeiçoada, uma opinião mais consensual, uma maneira mais eficaz e eficiente de fazer face ao problema.

Mas tudo começou porque alguém "morreu" para si mesmo...; mas fez isso não pelo prazer da dor e da "morte", ou para se "auto-flagelar" ou humilhar de forma masoquista, mas para, três dias depois, "ressuscitar" .

E mudou o mundo e a vida de muitos.

Por isso, faz sentido "morrer", mas para "nascer de novo".

Vila Franca do Campo (Açores), Páscoa de 1992