segunda-feira, 11 de abril de 2011

Crónicas de Avis (I) - Deus e a História a escreverem..


É curioso começar estes textos "Crónicas de Avis", num local onde passei em 1980 e hoje, 31 anos depois, tenho algumas responsabilidades numa instituição (imagine-se !) ligada Igreja Católica.
Cruzamento, casual, de duas visões organizacionais semelhantes: o centralismo, mas democrático e participado, ou, pelo menos, encenado.
Em 1980, talvez em Setembro, enquanto aguardava a discussão da tese de licenciatura em Sociologia, fiz, com outros colegas, de inquiridor numa sondagem sobre as eleições presidenciais que se adivinhavam para, julgo, Dezembro.
Da nossa "amostra" fazia parte o Concelho de Avis e um determinado número de pessoas escolhidas num sistema, para a época, seguramente aleatório : "na rua tal, fazes o inquérito a 2 casas pares e uma ímpar, depois, corta á direita e invertes o critério e assim sucessivamente" ; e isto servia para qualquer local, até recolhidas as entrevistas "amostradas". A empresa de sondagens ainda existe, é respeitável e de referência e, por tal, omito o seu nome.
Da Vila de Avis, desse Verão de 1980, recordo uma população muito envolvida na luta pela manutenção da "Reforma Agrária", então fortemente posta em causa pelo "bloco central" e com medidas drásticas para que terminasse.
Tive a honra de visitar, a convite, eu e os meus Colegas de "sondagem", várias propriedades que faziam parte da Cooperativa 1º de Maio, liderada pelo Camarada (do PCP) José Luís, hoje já falecido, mas que se manteve fiel, para variar, prejudicando-se a si e aos seus, até ao fim , ao que defendia : a terra a quem a trabalha. Hoje sei que foi um convite honroso e, do que vimos, guardo memórias vivas daquilo que foi uma utopia em construção, que, afinal, quem a montou acabou por a deixar cair, com os seus, sem ter feito disso um combate de princípio (e havia tantas armas espalhadas por tantas mãos...)
No Sábado, 9 de Abril de 2011, saí, no Expresso de Avis, para Matosinhos, via Lisboa (eu que oficialmente moro a 40 km do local) para o Congresso do PS, de que sou militante desde 2008.
Eram 7h 30m e vi o que, a todo o momento, constato em Avis : ruas desertas, sem ninguem, a não ser alguns nos poucos cafés abertos, a ler o jornal e beber o seu "copo".
Recordei 1980 e o actual largo da Câmara, então cheio de tractores e atrelados; e os celeiros comuns logo em frente. E a vida que fervilhava.
Hoje, edifícios, felizmente em reconstrução, vão permitir defender essa e outras memórias, sobretudo a mais antiga, a da Ordem de Avis, mais velha que a nacionalidade.
Num Concelho onde o PCP/CDU tudo ganh em qualquer eleição, desde 1974, acho imensamente curioso que seja uma Fundação, instituída por herança doada a estruturas da Igreja Católica (precisamente a partir de terras ocupadas e depois devolvidas) a chamar a si a rsponsabilidade de qualificar, activamente, com uma postura de proximidade cidadã, os habitantes deste Concelho.
Terá passado, nesta comunidade, à boa maneira dos Judeus, o "grande perdão", ou seja, "partir para outra". Por alguma rzão, em Avis, a Judiaria e Mouraria são dentro dos muros da cidade e não lá fora ...; a inclusão também é património histórico e de identidade.
Deus (e a História) escrevem direito por linhas tortas...

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